terça-feira, 9 de dezembro de 2008

primavera não nos deixe

" ...

sendas de ôku - a viagem de bashô

luas e sóis (meses e dias) são viajantes da eternidade.
os anos que vêm e se vão são viajantes também.
os que passam a vida a bordo de navios ou envelhecem montados a cavalo estão sempre de viagem, e seu lar se encontra ali onde suas viagens os levam.
os homens de antigamente, muitos, morreram pelos caminhos, e a mim também, durante os últimos anos, a visão de uma nuvem solitária levada pelo vento me inspirou contínuas idéias de meter o pé na estrada...

... quando, em 27 de março, me pus à caminho, havia neblina no céu da madrugada.
a pálida lua matutina tinha perdido o brilho, mas ainda se podia vislumbrar debilmente o monte Fuji. Em Ueno e Yanaka, os ramos das cerejeiras em flor me despertaram pensamentos tristes ao perguntar-me se algum dia os voltaria a ver.
meus amigos mais queridos tinham todos vindo à noite na casa de Sampu, para poder me acompanhar durante o curto trecho de viagem que eu faria em barco.
quando desembarcamos num lugar chamado Senju, a idéia de começar uma viagem tão longa me encheu de tristeza.
de pé sobre o caminho que talvez ia nos separar para sempre nesta vida que é como um sonho, chorei lágrimas de despedida:


primavera não nos deixe
pássaros choram
lágrimas no olho do peixe


..."

(Tradução: Paulo Leminski, in Bashô, a lágrima do peixe, ed. Brasiliense, 1983)

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